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A POÉTICA CREPUSCULAR DE KAVÁFIS
Víctor Sosa (Agulha, no 10, 3/2001)
Depois de um prolongado eclipse que atravessou vários séculos de baixa intensidade, o século XIX marcará um significativo renascimento da poesia na Grécia moderna. Um século marcado por ventos independentistas - a guerra de independência contra os turcos se estendeu de 1821 a 1827 -, por redefinições da identidade nacional e por paulatina implantação do demótico na escritura poética em substituição do katharevousa defendido pelos puristas do neoclassicismo. Sobretudo as duas últimas décadas do século XIX marcaram a preeminência do demótico e, do mesmo modo, o nascimento de grandes figuras poéticas como Nikos Kasantzakis, Konstantino Kaváfis, Giorgos Seféris e Odisseas Elýtis.
O caso de Kaváfis - nascido em 1863 e falecido em 1933 em sua natal Alexandria - é dos mais peculiares no horizonte da literatura grega moderna. Isso se dá porque parece não corresponder com a época de conflitos e redefinições do projeto nacionalista em seu país. O alexandrino preferiu navegar contra a corrente e remontar a história da Grécia que é a história do homem, a soma de todas as paixões e também o iminente destino trágico da aventura humana. Pode-se entender esta atitude se levarmos em conta sua prematura formação inglesa - de 1872 a 1878 viveu com sua família na Inglaterra - e sua tardia aprendizagem da língua materna, ou seja, grega.
Cosmopolitismo que também denota uma espécie de exílio, tanto lingüístico como espiritual. Kaváfis construiu seus próprios parâmetros poéticos - essa singularidade de voz que o caracteriza - desconhecendo as tendências e as intermináveis disputas do momento - sobretudo entre os defensores do katharevousa e os da língua demótica. Depreciando sua época, o alexandrino se auto-define como "poeta-historiador" e busca suas fontes criativas através do relato dos cronistas e historiadores antigos, como é o caso de Plutarco. Mas esta inclinação historiográfica também define uma poética personalíssima e em muitos momentos intimista. Define uma ficcionalização da história e uma subordinação desta às subjetivas redes que o poeta trama a partir de uma assumida consciência da desdita. Kaváfis - como todo historiador - seleciona os infinitos acontecimentos que dão lugar à história; acomete uma seletiva e cirúrgica dissecação dos fatos. Mas - como todo poeta - vivifica a matéria morta da história com o impulso sangüíneo da subjetividade. O poeta desenha seu próprio rosto nos muros da história e da mitologia helênica. Não é por acaso que a Grécia eleita por Kaváfis seja a decadente, não a do esplendor clássico do século V, mas sim a helênica dos últimos anos do paganismo e, sobretudo, a do mundo asiático e bizantino. Essa eleição é sintomática e também se vincula com a sensual debilidade de seus adolescentes recriados em seus poemas intimistas e com as reiteradas lamentações da velhice e do inexorável passar do tempo.
A partir de tais parâmetros, explica-se sua manifesta simpatia por um personagem terrivelmente trágico: o imperador Juliano - chamado o Apóstata pelos cristãos - quem inutilmente teve a intenção de restaurar os antigos cultos pagãos quando o cristianismo já encarnava de maneira viva em todo o mundo antigo:
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A propósito de nossas convicções religiosas disse o estúpido do Juliano: li, compreendi, rejeitei. Ou seja, nos reduz a nada com seu "rejeitei", muito ridículo. Semelhantes ocorrências não valem para nós cristãos. "Leste, mas não compreendeste; pois se tivesses compreendido, não terias rejeitado" respondemos de imediato.
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A primeira pessoa do plural, a qual Kaváfis delega o dom da fala, e que representa o corpo já configurado do cristianismo na cultura helênica, não eclipsa, entretanto - mais além da eloqüente reação cristã às palavras do imperador -, a simpatia do poeta pela figura trágica do Apóstata. Kaváfis ficcionaliza o icárico intento de Juliano por reviver os destronados deuses do Olimpo. Admira no imperador duas coisas: seu objetivo de restituição e seu intrínseco fracasso - e esse objetivo falido se enobrece justamente à luz de sua histórica impossibilidade. Outra vez: a história a que recorre Kaváfis é - como diria Lezama Lima - uma era imaginária, uma ficcionalização da história com a qual se quer objetivar - no corpo da escritura - as reiteradas propensões temáticas do poeta.
Por outro lado, se diria que existe um constante travestismo religioso na poética de Kaváfis, travestismo que coincide com a ambigüidade e o sincretismo cristão-pagão dos momentos históricos por ele selecionados. No poema "Na igreja", há uma declaração de fé cristã mas também a suspeita desta declaração. A voz poética enfatiza "A pompa de seus ornamentos" só para ficar aí, não para transcendê-lo na essência da paixão cristã. Vejamos:
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Amo a Igreja - seus querubins de seis asas nos lábaros,
a prata de seus cálices, seus candelabros,
as redomas, seus ícones, seu púlpito.
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Quando entro na Igreja dos gregos,
com o aroma do incenso,
com a música e cantos de liturgia,
a presença majestosa dos sacerdotes
e o ritmo grave de cada movimento seu
magníficos na pompa de seus ornamentos -
meu pensamento sonha com os grandes valores de nossa raça
com nossa gloriosa Bizâncio.
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O que deslumbra é o brilho da liturgia, a opulenta pedraria do ritual com seu barroco frontispício. Pensa-se em Bizâncio então, mas pensa-se, implicitamente, como uma ausência - "o pensamento sonha", nos diz Kaváfis, ou seja, anseia a glória desvanecida, dissolvida no pó da história mas ainda viva no imaginário coletivo dos gregos. Por outro lado, não há um significativo distanciamento nesse entrar "na igreja dos gregos"? Como se o poeta marcasse sua não pertinência, sua diferenciação, sua excêntrica condição de estrangeiro em sua própria terra. Mas não, Kaváfis - sobretudo - era estrangeiro em sua época, não participou emocionalmente das vicissitudes que dão sentido e razão de ser a seus contemporâneos. A fuga para trás, para este adentro da memória histórica, era sua maneira de estar no mundo e sua maneira, paradoxalmente, de ausentar-se dele.
Decadência e nascimento, nunca plenitude; amanhecer e ocaso de uma civilização, nunca seu meio-dia heróico. Dentro desta poética das margens, das orlas de uma civilização, destaca-se um de seus maiores poemas ("Esperando os bárbaros"):
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O que esperamos congregados no fórum?
É aos bárbaros que chegam hoje.
- Por que esta inação no Senado?
Por que estão aí sem legislar os Senadores?
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Porque hoje chegarão os bárbaros.
Que leis vão fazer os Senadores?
Já legislarão, quando, chegarem, os bárbaros.
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- Por que nosso imperador madrugou tanto
e em seu trono, à porta maior da cidade,
está sentado, solene e cingindo coroa?
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Porque hoje chegarão os bárbaros.
E o imperador espera para dar
a seu chefe a acolhida. Inclusive preparou,
para entregá-lo, um pergaminho. Nele
muitos títulos e dignidades estão escritos.
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- Por que nossos dois cônsules e pretores saíram
hoje com togas vermelhas bordadas;
Por que levam braceletes com tantas ametistas
e anéis engastados e esmeraldas reluzentes;
Por que empunham hoje preciosos báculos
em prata e ouro magnificamente cinzelados?
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Porque hoje chegarão os bárbaros;
e espetáculos assim deslumbram aos bárbaros.
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- Por que não recorrem, como sempre, os ilustres oradores
a pronunciar seus discursos e dizer suas coisas?
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Porque hoje chegarão os bárbaros
e os aborrecem a eloqüência e os discursos.
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- Por que começa depois este desconcerto
e confusão (Quão graves se tornam os rostos!)
Por que ruas e praças depressa se esvaziam
e todos voltam para casa compungidos?
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Porque veio a noite e os bárbaros não chegaram.
Algumas pessoas vieram das fronteiras
E contaram que os bárbaros não existem.
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E o que será de nós agora sem bárbaros?
Esta gente, definitivamente, era uma solução.
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Kaváfis recria uma cidade imaginária e decadente. Uma cidade imóvel em sua civilizada inércia decorosa, em sua brandura de cônsules e leis e oradores. Um estado pacífico onde a ordem e a eqüidade imperam mas onde falta algo. Este algo que falta chama-se outridade e outridade, como se sabe, só se encontra fora: com os bárbaros. Duas realidades se articulam no quadro poético: o adentro plúmbeo, expectante, solene dos civilizados, e o afora esperançoso, deslumbrante, sensual e selvagem dos bárbaros. Lá, naqueles de além das fronteiras, está a felicidade, a vida simples. Mas civilização é destino, é, portanto, fatalidade. Kaváfis reafirma isso senão na quietude, na solene e ansiosa espera dos cidadãos e seus dignatários. Só se rompe este hieratismo teatral, este encantamento coletivo - e "ruas e praças depressa se esvaziam"-, quando algumas pessoas, aquelas vindas das fronteiras, trazem a má notícia de que os bárbaros não existem. Sem outridade não há saída. A cidade deve resignar-se a viver sua vazia decadência tão desprovida de estímulos como de bárbaros.
Por outro lado, a dualidade situacional que impera no poema se reflete no plano formal; a dupla anáfora dialógica, que desenha o seco ritmo de perguntas e respostas, é um recurso que, em vez de esclerosar o discurso, impele a sua potência e imprime uma maior eficácia dramática. O recurso do diálogo é reiterativo em Kaváfis, um poeta que nega a ditadura da metáfora em um momento em que praticamente era impossível desprender-se facilmente da dita figura retórica.
No poema "Deus abandona Antônio", o sentimento de perda adquire características épicas singulares já que se trata da queda de Alexandria - cidade natal de Kaváfis - e de um desgraçado Marco Antonio que não aceita, com a dignidade devida a sua alta investidura, o destino fatal. Aqui - como no grosso de sua poética -, Kaváfis assume uma clara postura estóica diante do sempre trágico destino da humanidade:
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Quando de repente, a meia-noite, ouve-se
passar invisível um báquico cortejo
com músicas maravilhosas, com vozerio,
tua fortuna fraquejante, tuas obras
falidas, os sonhos de tua vida
que saíram todos vãos, não os desperdice inutilmente.
Como disposto há muito tempo, como um valente,
despeça-te, despeça-te da Alexandria que se afasta.
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Sobretudo, não te enganes, não digas que foi
um sonho, que teu ouvido te enganou;
não te refugies em tão vãs esperanças.
Como disposto há muito tempo, como um valente,
como cabe a ti, que de uma cidade tal
mereceste a honra,
aproxima-te decidido da janela
e escuta comovido, mas sem
súplicas nem lamentos de covarde,
como gozo último os sons,
os maravilhosos instrumentos do místico, báquico cortejo
e despeça-te, despeça-te da Alexandria que tu perdes.
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Esta referência - e reverência - ao fracasso histórico em seus personagens, à iminente derrota de todo um ideal traçado pelo homem - consubstancial à obra de Kaváfis -, podemos, todavia, rastrear na poesia popular proveniente da distante Bizâncio, chegando inclusive até o século XVIII, considerado como a época de ouro dos cantos populares gregos. O poema anônimo "Os peixes de Constantinopla" é um bom exemplo deste lírico sentimento de derrota:
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Uma religiosa cozinhava uns peixes em uma panela quando uma voz, uma voz débil, mas que vinha de Deus nas alturas, lhe disse:
- Deixa de cozinhar, boa mulher, pois a cidade será capturada pelos turcos.
- Quando estes peixes voarem, quando saírem vivos daqui, só então entrará o Turco e a cidade será sua.
Os peixes reviveram, empreenderam o vôo e o emir entrou com sua cavalaria.
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Mas talvez seja no poema "Ítaca" - um dos mais celebrados de Kaváfis - onde o alexandrino soube medir seu pessimismo e fazer confluir duas vertentes caras à sua poética: a retidão no agir e o desfrute dos prazeres. Outra vez a ambivalência como norma, como constante em seu discurso, mas sustentada na poética homérica da viagem de Odisseu:
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Quando começares tua viagem a Ítaca
pede que o caminho seja largo,
cheio de aventuras, cheio de experiências.
Não temas aos lestrigões nem aos ciclopes,
nem ao colérico Possêidon,
tais seres jamais acharás em teu caminho,
se teu pensar for elevado, se seleta
for a emoção que toca teu espírito e teu corpo.
Nem aos lestrigões nem aos ciclopes
nem ao selvagem Possêidon encontrarás
se não os levares dentro de tua alma,
se não os ergue tua alma diante de ti.
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Pede que o caminho seja largo.
Que sejam muitas as manhãs de verão
em que chegues - com que prazer e alegria! -
a portos antes nunca vistos.
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Detém-te nos empórios de Fenícia
e mostra-te com belas mercadorias,
nácar e coral, âmbar e ébano
e toda sorte de perfumes voluptuosos,
quanto mais abundantes perfumes voluptuosos possas.
Veja muitas cidades egípcias
a aprender, a aprender de seus sábios.
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Tenha sempre Ítaca em teu pensamento.
Tua chegada ali é teu destino.
Mas não apresses nunca a viagem.
Melhor que dure muitos anos
E atracar, velho já, na ilha,
Enriquecido de quanto ganhaste no caminho
Sem esperar que Ítaca te enriqueça.
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Ítaca te ofereceu tão bonita viagem.
Sem ela não haverias começado o caminho.
Mas já não tem nada a dar-te.
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Ainda que as ache pobre, Ítaca não te enganou.
Assim, sábio como te tornaste, com tanta experiência,
Entenderás já o que significam as Ítacas.
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A história, como o mito, é uma coisa mental. Kaváfis concorda consigo mesmo: os ciclopes, se aparecem, é porque habitam na alma humana. Como os bárbaros, os anseios e os medos são seres imaginários. Kaváfis toma partido pelo controle dos sentidos - por este exato meio aconselhado pelos sábios - mas, ato contínuo, recomenda o excesso e a voluptuosidade. Parece contraditório, mas não é, melhor, é complementar. Entre o ascetismo e o hedonismo, o círculo se fecha, se fecha também o périplo de uma a outra Ítaca: da juventude à velhice, da pobreza à riqueza, da ignorância à virtude da sabedoria.
Esta dupla atitude que vimos revisando - e que atravessa como uma constante a poética do grego - tem, no poema "Os perigos", seu mais definido perfil:
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Disse Mirtias (estudante sírio
em Alexandria, sob o reinado
de Constante Augusto e Constâncio Augusto;
em parte gentil e em parte cristianizante):
"Fortalecido pela contemplação e o estudo,
não temerei, como um covarde, minhas paixões.
Entregarei meu corpo aos prazeres,
aos gozos sonhados, aos mais ousados eróticos desejos,
aos impulsos lascivos de meu sangue, sem
medo algum, pois quando quiser
e o querei, fortalecido
como estarei pela contemplação e o estudo -
acharei de novo nos críticos instantes
meu espírito ascético de antes."
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O estudante sírio de Alexandria - "em parte gentil e em parte cristianizante"- encarna, claro está, o alter-ego de Kaváfis. Não há dúvida que os perigos são as paixões - das quais, todavia, Kaváfis-Mirtias não temerá porque saberá complementar com sua contraparte ascética -, mas também podem ser a contemplação e o estudo, se estes se impuserem de forma exclusiva no comportamento humano. Nesse sentido, poderíamos pensar um uma espécie de polaridade apolíneo-dionisíaca que integra, em sua vital ambivalência, as duas principais vertentes do pensamento antigo dos gregos: a ascética ou estóica e a hedonista.
Como toda a poesia de Kaváfis marca esse pendular périplo entre o histórico e o íntimo, entre o apolíneo e o dionisíaco, não podemos deixar de assinalar - e de levar em conta para a análise de sua obra - suas inclinações homoeróticas. Em um de seus mais intimistas e autobiográficos poemas, intitulado "Muralhas", Kaváfis se lamenta de sua existencial condição de insular e da marginalização da qual foi objeto de seus contemporâneos, mas sem especificar os motivos. Ainda que elíptico, o texto deixa inferir as possíveis razões morais, homofóbicas, que dão lugar a dita lamentação e que, se pensarmos no contexto histórico que coube ao poeta viver, adquirem um maior significado:
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Sem atenção, sem piedade, sem pudor
grandes e altas muralhas levantaram ao meu redor.
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E agora estou aqui sem esperança.
Não penso senão que este destino devora meu coração;
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porque fora, muito teria eu que fazer.
Por que, ai, não reparei quando levantavam a muralha?
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Mas nunca ouvi o ruído nem a voz de seus autores.
Sem senti-lo, fora do mundo me cercaram.
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A referência ao mundo é a referência à sua época. Kaváfis demarca responsabilidades e transfere a culpa de sua ausência a seus detratores silenciosos. O mecanismo não é de todo convincente, sobretudo se levarmos em conta que o cerco a que faz referência possibilitou a construção de seu imaginário poético, atitude que tem muito de voluntário e que os leitores de agora, e de sempre, devemos agradecer.
Do histórico ao íntimo há um passo, ou - às vezes - uma simples, uma imperceptível mudança no ângulo do olhar; ambos, confinam com o erótico, com esse sentimento do erótico que, em Kaváfis, não pode encarnar mais do que na perda: se rememora o prazer sensual desde o exílio da escritura, desde esse estar em outra parte que caracteriza sempre a toda figura nostálgica:
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Pensava colocá-la um uma parede de meu quarto.
Mas a pôs a perder a umidade na gaveta.
Não porei um uma moldura esta fotografia.
Devo guardá-la com cuidado.
Estes lábios, este rosto.
Ah, se por um dia só, só por um
instante voltasse seu passado!
Não porei um uma moldura esta fotografia.
Sofreria por vê-la tão danificada,
me angustiaria estar inclinado a, por azar
uma palavra, o tom de minha voz me trair,
se por ela alguma vez me perguntassem.
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Estes cruzamentos temáticos, estas cabeças de Jano do poeta alexandrino formam um corpus compacto que estabelece uma ética perfeitamente definível em seu trabalho poético. Moral e destino são inseparáveis em toda a obra de Kaváfis; moral no sentido de responsabilidade assumida de maneira consciente; destino como fatalidade inescusável que ultrapassa todo voluntarismo humano.
Como aconteceu com toda a intelligentsia grega moderna, Kaváfis recebe a tradição helênica através da reinterpretação européia - por meio do romantismo - e esta fratura cultural subjacente pode explicar mais sobre uma ambigüidade no pensamento kavafiano, como sua pertinência à igreja ortodoxa e seu filopaganismo manifesto. Daí sua preocupação constante pelo entramado mito-histórico helênico, essa era imaginária que o serve de apoio para construir sua própria identidade, sua personae e, com ela, sua bem urdida muralha de contenção contra as bárbaras invasões de seus contemporâneos.
O certo é que seu cosmopolitismo, seu universalismo de estirpe européia - que o separa tanto da vertente nacionalista de seu país como da tradição clássica e academicista -, o converte no primeiro poeta grego da modernidade que ultrapassa o âmbito nacional e se projeta, como representante de uma poética até então excêntrica, nessa Ítaca universal que é o território da autêntica poesia.